A reforma do Código Civil e a exclusão do cônjuge como herdeiro necessário: um olhar sob a perspectiva de gênero

Autores

DOI:

https://doi.org/10.55892/jrg.v8i18.2266

Palavras-chave:

Direito das Sucessões, Desigualdade de gênero, Vocação sucessória da mulher

Resumo

A sucessão legítima no código civil de 2002 classificou o cônjuge como herdeiro necessário, reconhecendo a importância da construção do patrimônio familiar independentemente do valor financeiro que cada cônjuge agregaria aos bens da família. Com a elevação do cônjuge ao patamar de herdeiro legítimo no primeiro lugar na vocação hereditária em concorrência com os descendentes, em que pese não tenha havido menção específica ao gênero, foi possível reparar desigualdades e desvalorizações em relação à mulher ocorridas ao longo dos séculos, visto que a mulher sempre esteve nos bastidores dos trabalhos de cuidado que favorece cuja sociedade se apropria. Além disso, no Código Civil de 1916, que precedeu o código de 2002, a mulher não possuía direito de herança do marido, e só podia exercer ofício remunerado com a autorização dele, dentre outras limitações que colocavam a mulher em condição de inferioridade em relação ao homem. Em 2025, mesmo já consolidado o direito à sucessão, o que beneficia mulheres que sempre tiveram seus trabalhos domésticos invisibilizados, houve a proposição de um anteprojeto de Novo Código Civil, onde o cônjuge passa a não mais ser herdeiro necessário. Embora também não haja menção ao gênero, o que pode levar a crer que a proposta respeita a equidade entre gêneros, as mulheres são as que sentirão de forma mais intensificada o impacto dessa medida, o que pode levar a um cenário de empobrecimento feminino e empobrecimento familiar. Diante dessa perspectiva, a presente pesquisa buscou relatar o histórico do direito à herança por parte do cônjuge, utilizando, para tanto, as lentes de gênero, o que é objeto do primeiro capítulo. O segundo capítulo se propõe a analisar a condição da mulher na estrutura familiar brasileira, em especial no que diz respeito ao trabalho de cuidado, realizado de forma gratuita e invisibilizada, e como isso impacta positivamente a família enquanto desvaloriza o papel da mulher na sociedade. O terceiro e último capítulo se propõe a abordar criticamente o anteprojeto do Novo Código Civil, demonstrando os aspectos que levam a crer que a retirada do cônjuge como herdeiro necessário se revela como um retrocesso e como um desrespeito aos direitos conquistados pelas mulheres.

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Biografia do Autor

Mara Juliana Soares Marques Fontineles, Faculdade Evangélica de Valparaíso-GO, Brasil

Graduanda em Direito pela Faculdade Evangélica de Valparaíso - GO. Contato.

Karini Luana Santos Pavelquesi, Centro Universitário do Distrito Federal - UDF

Mestra em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas pelo Centro Universitário do Distrito Federal - UDF.

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Publicado

2025-06-15

Como Citar

FONTINELES, M. J. S. M.; PAVELQUESI, K. L. S. A reforma do Código Civil e a exclusão do cônjuge como herdeiro necessário: um olhar sob a perspectiva de gênero. Revista JRG de Estudos Acadêmicos , Brasil, São Paulo, v. 8, n. 18, p. e082266, 2025. DOI: 10.55892/jrg.v8i18.2266. Disponível em: http://www.revistajrg.com/index.php/jrg/article/view/2266. Acesso em: 17 jun. 2025.

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